Publicado em: 24 de agosto de 2018
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu liminar na Reclamação (RCL) 31315 para suspender os efeitos de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que determinou a retirada de reportagens em vídeo nas quais aparecem imagens de policiais réus em ação penal na qual se apura o “massacre do Carandiru”, homicídios cometidos durante a invasão do presídio em 1992. Em análise preliminar do caso, o ministro verificou que a decisão do TJ-SP constitui censura prévia, gerando prejuízos à liberdade de expressão assegurada pela Constituição Federal.
No caso dos autos, os policiais ajuizaram ação ordinária pedindo que o Universo Online (UOL), a Rede Globo e a Rede TV se abstivessem “de veicular qualquer imagem ou dado qualificativo dos autores que os vinculem ao caso Carandiru”, alegando que o compartilhamento de reportagens seria ilícito, pois, nos autos da ação criminal em que são réus, houve decretação de sigilo a respeito de suas qualificações. Na primeira instância, foi negado pedido de liminar. Em julgamento de recurso, o TJ-SP determinou a retirada do conteúdo, afirmando que a divulgação da imagem dos envolvidos no “massacre do Carandiru”, colocaria suas vidas em risco.
Na reclamação ajuizada no STF, o UOL sustenta que a decisão do TJ-SP representa “censura tanto ao vídeo jornalístico já publicado quanto a outros conteúdos que vierem a ser publicados, restringindo evidentemente de forma inconstitucional o livre exercício da atividade de imprensa e comunicação”. Argumenta, ainda, que a “ordem prévia de abstenção de uso da imagem em matérias futuras, impõe ao UOL dever de agir como verdadeiro censor de futuras matérias jornalísticas veiculadas em sua plataforma, por si e por terceiros”.
Decisão
O ministro Barroso afirmou que, ao determinar a remoção de vídeo que exibe a imagem de agentes públicos réus durante a leitura de sentença de julgamento público e de outros conteúdos que possam vinculá-los ao denominado “massacre do Carandiru”, o TJ-SP se afastou da decisão tomada pelo STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, quando a Corte tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e de opiniões.
O relator destacou que, por ser uma pré-condição para o exercício esclarecido dos demais direitos e garantias, a liberdade de expressão tem posição preferencial no Estado democrático brasileiro. Segundo ele, eventual uso abusivo da liberdade de expressão deve ser reparado, preferencialmente, por meio de retificação, direito de resposta ou indenização.
No caso dos autos, explica o ministro, não há dúvida de que a notícia retrata fatos verdadeiros, que ocorreram em sessão de leitura de sentença ocorrida em local público. Ressalta, também, a existência de interesse jornalístico na cobertura de desdobramentos da apuração de conduta supostamente delituosa que alcançou grande repercussão e envolveu atuação direta do poder público. Segundo o ministro, a decisão do TJ-SP reconhece esse fato ao afirmar que “não se questiona o legítimo interesse público na divulgação de informações relativas ao andamento do processo criminal envolvendo o ‘massacre do Carandiru’, o que pode ser livremente realizado considerando a ausência de segredo de justiça”.
O relator acrescentou que os interessados em proibir a divulgação da notícia são policiais, ou seja, atuaram como agentes públicos durante a intervenção no presídio do Carandiru, circunstância que induz um abrandamento da tutela de seus direitos de privacidade, já que, em um regime republicano, as atuações estatais, em regra, devem ser públicas. Para o ministro, o fato de a decisão reclamada invocar, sem qualquer fundamento específico, que haveria “exposição desnecessária da imagem dos embargados”, possibilitando seu reconhecimento “por terceiros mal intencionados, o que coloca em risco a vida e a segurança de todos os envolvidos”, não justifica, em juízo de cognição sumária, a proibição da exibição de suas imagens em matéria jornalística.
Ao deferir a liminar, o relator afirmou que considera plausível a tese de que a decisão do TJ-SP afrontou a autoridade da decisão proferida na ADPF 130, ao restringir de forma desproporcional as liberdades de expressão. “Não se está a menosprezar a honra e a imagem de eventuais ofendidos, mas a afirmar que esses bens jurídicos devem ser tutelados, se for o caso, com o uso de outros instrumentos de controle que não importem restrições imediatas à livre circulação de ideias, como a responsabilização civil ou penal e o direito de resposta”, argumentou o ministro.
PR/AD
Fonte:Supremo Tribunal Federal