Publicado em: 15 de junho de 2022
O deslocamento das equipes multiprofissionais do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) é difícil também pelo interior do Estado, seja por estradas de terra em estado precário, ou pelos rios da Amazônia, em lanchas, barcos e balsas lotadas. Relatos de acidentes que, por sorte não resultaram em situações mais graves, são comuns. Um desses relatos é das colegas Josefa Antônia de Souza Dutra, pedagoga, de 57 anos, e de Viviane Rodrigues Pereira, de 44 anos, assistente social, ambas da 5ª Vara da Infância e Juventude de Santarém.
A equipe do polo de Santarém atende alta demanda das comarcas do interior. Nestes deslocamentos de horas, as duas já sofreram bastante. Nas viagens pelos rios o deslocamento chega a demorar até 24 horas para as localidades mais distantes.
“O barco demora mais tempo de viagem, temos ido mais de lancha, que é bem mais rápido, não podemos perder tempo. Pra Juruti, por exemplo, de lancha a viagem dura sete horas. Além de mais demorados, os barcos andam tão lotados que às vezes não tem lugar pra descansar e a viagem dura muito mais horas”, explica Viviane.
A travessia de balsa é sempre lotada, as servidoras precisam chegar cedo tanto na ida quanto na volta para não perderem o lugar, sob pena de não poderem voltar pra casa no dia esperado. “A gente precisa cumprir os prazos do processo, a gente se organiza para fazer essas viagens e não pode perder a balsa”, complementa a servidora. Além disso, quanto mais tempo permanecem em outra comarca, mais o serviço acumula na comarca onde elas são efetivamente lotadas.
Josefa teve uma experiência traumática quando viajou para Prainha. “A primeira vez que fui para Prainha de barco tive um susto muito grande. O barco no rio Amazonas ficou muito agitado, jogando água para todos os lados, foi desesperador, ninguém sabe o risco que a gente passa dentro de um barco”, conta.
As duas viajam para atuar em casos de infância e adolescência como casos de violações de direitos, cometimento de ato infracional, medidas protetivas para vítimas de abusos, assistência para crianças em situação de risco ou negligência, e adoção via o Sistema Nacional de Adoção (SNA).
Em uma das situações mais graves, em que Viviane e Josefa precisaram ir para a região do Lago Grande, pertencente à jurisdição da Comarca de Santarém, sofreram um acidente de carro. Elas já estavam retornando para Santarém, no carro do tribunal, após realizarem as visitas nas comunidades, para pegarem a balsa de volta.
Entretanto, no meio da estrada dois pneus do carro furaram, o que o fez derrapar pela pista e cair na vala ao lado da estrada. O susto foi muito grande para toda a equipe. “Eu imaginei que íamos capotar, eu me segurei ali, graças a Deus que não aconteceu. O carro girou, rodopiou e caiu numa vala ao lado. Todos estavam de cinto e ninguém se feriu”, relembra Viviane.
Passado o susto, a outra dificuldade seria como sair dali, em uma estrada praticamente no meio do nada, sem sinal de telefonia, nem internet. Sem ter outra saída, as colegas precisaram subir no carona de uma moto que passava pelo local, para ir até a comunidade mais próxima buscar ajuda para consertar o carro e avisar ao Fórum e às suas famílias, que não retornariam mais naquele dia.
“Nós duas fomos na moto, sem capacete. Fomos até onde teria uma escola que poderia ter wi-fi. Lá estava tudo fechado, não tinha como falar com ninguém. Ia passando um ônibus desses de interior, que leva de tudo, e nós não tínhamos dinheiro para pagar passagem. Perguntamos ao motorista se poderia levar a gente até outra comunidade, ele deixou. Chegando lá, falamos com os moradores que aceitaram emprestar a internet para informarmos o fórum o que tinha acontecido. Avisamos a diretora e a juíza, a Josefa conseguiu avisar a família, mas não tínhamos como voltar”, relembra Viviane.
As duas conseguiram hospedagem para a equipe, o conserto do carro com um mecânico e apoio da Polícia Militar, por meio de um pedido da juíza do Fórum. Como a equipe estava sem dinheiro, o reparo no carro, a hospedagem e alimentação foram pagos somente depois quando as servidoras conseguiram retornar.
Por essa e outras dificuldades rotineiras que as equipes multiprofissionais passam, Viviane e Josefa apoiam o movimento pela reivindicação do adicional, que está sendo organizado pelo Sindicato dos Funcionários do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (SINDJU).
“Acima de tudo é algo justo, justo de fato porque passamos por situações muito perigosas. Claro que a questão remuneratória é importante, mas é algo além disso, é de fato e de direito, é um reconhecimento pelo trabalho. A gente passa por situações diversas. Entramos em boca de fumo, sabendo que ali tem uma criança e precisamos conversar com ela. Colocamos as nossas vidas em risco. Aqui na cidade também vamos em locais de extremo risco, onde não tem polícia com a gente. É um risco iminente, para as nossas vidas. Estamos sim, fazendo jus”, assegura Josefa.